A Proteção de Crianças e Jovens UM OLHAR ATRAVÉS DO(S) TEMPO(S)
- Diana Borges
- 14 de jul. de 2021
- 16 min de leitura
Introdução
Sempre que é abordado a temática da infância, não é possível reportarmo-nos a este período: estágio da vida, como uma conceção, mas sim, como um conjunto de características que introduzem determinados termos, como a família, a escola, pai, mãe, entre outros, e que contribuem para que existam certas formas de pensamento e de vivenciar a infância.
Ao longo dos séculos, existiu sempre um enquadramento desigual entre crianças de meios desfavorecidos e meios mais favorecidos, mas quando a compreensão do real valor da infância ocorreu, a sociedade procurou através de programas sociais e de assistência, compensar essa desigualdade entre as crianças e adolescentes. As crianças e os adolescentes na atual sociedade, têm ganho um papel relevante no que concerne às questões relacionadas com o seu desenvolvimento, a sua segurança e a sua proteção, preocupações que não existiam no passado.
A assimilação que a criança e o adolescente são seres que têm direitos e desejos particulares despertou uma vontade de ocorrer junto dos mesmos quando o seu desenvolvimento positivo era posto em causa. A família independentemente da sua tipologia, sempre foi vista como uma representação de extrema importância, pois é considerada vital no processo de crescimento e desenvolvimento da criança ou adolescente.
A falta de momentos de socialização familiar e comunitária, assume na atualidade, um grave problema social que deixa um grosso conjunto de crianças e adolescentes em posições de perigo, ou seja, posições que poem em causa a sua segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento, e em circunstâncias limites, ofensas reais em detrimento da ação ou falta dela por terceiros ou das próprias crianças e adolescentes.
Neste ensaio, optei por abordar inicialmente o estatuto histórico da criança, a evolução dos seus direitos e posteriormente uma análise de questões relacionadas com a proteção de crianças e jovens em risco. Nestes contextos efetuei um paralelismo com as temáticas abordadas na unidade curricular e com a bibliografia sugerida. Para isso consultei vários artigos, trabalhos académicos e outros conteúdos disponibilizados online.
Fundamentação Teórica
O valor atribuído à infância nem sempre teve a mesma conotação que tem atualmente, foi construído a partir de modificações económicas e políticas da estrutura social.
Contributos como os do autor (Áries, P. 1978) sobre a evolução histórica do sentimento de infância provam que o conceito de infância nem sempre teve o mesmo significado, houve uma alteração da conceção de infância ao longo dos séculos, ou seja, aquando a mudança do papel social e da inserção da criança na sociedade, o conceito de infância também altera.
Este autor, tendo sido considerado um pioneiro na análise e conceção de criança, traçou um perfil das características da infância a partir do século XII, no que concerne ao sentimento sobre a infância, o seu comportamento no meio social na época e suas relações com a família.
“O sentimento da infância não significa o mesmo que afeição pelas crianças, corresponde à consciência da particularidade infantil, essa particularidade que distingue essencialmente a criança do adulto, mesmo jovem.” (Áries, P. 1978:99)
A criança era considerada uma forma de manipulação ideológica dos adultos, pois a partir do momento em que se tornavam autónomas fisicamente, eram inseridas no mundo adulto. Outra característica importante diz respeito à socialização das crianças, uma vez que esta não era controlada pelas suas famílias, e a educação era apreendida através da execução de tarefas realizadas com os adultos.
Segundos os contributos do autor, podemos ainda dividir, segundo o mesmo, em três períodos o conceito de infância e do papel da criança, entre os seculos XII e o XVIII.
Num primeiro período a criança era considerada um adulto em miniatura por não haver uma distinção entre o mundo adulto e o mundo infantil, ou seja, a criança “inseria-se na sociedade dos adultos” sem nenhuma preocupação em relação à sua formação enquanto um ser específico, sendo exposta a todo o tipo de experiências.
Segundo Áries, até o século XVII, a socialização da criança e a transmissão de valores e de conhecimentos não eram assegurados pelas famílias. A criança era afastada muito cedo dos seus pais e apenas convivia com outros adultos, auxiliando-os nas suas tarefas. A partir desse momento, não se diferenciava mais desses. Nesse contato, a criança passava dessa fase diretamente para a vida adulta. (Áries, 1981).
A duração da infância não era bem definida e o termo "infância" era utilizado indiscriminadamente, sendo usado, inclusive, para se referir a jovens com dezoito anos ou mais de idade (Áries, 1981). Desta forma, a infância tinha uma longa duração, e a criança acabava por assumir funções de responsabilidade, saltando etapas do seu desenvolvimento. Até a sua forma de vestir era igual à de um adulto.
Num segundo período, Ariès evidencia uma mudança na perspetiva da criança, ou seja, a sociedade preocupa-se em preservar a sua inocência, separando a da vida dos adultos, inserindo-a num contexto escolar sob a supervisão dos professores/tutores.
“o tempo escolar é, antes de tudo, o tempo de um encerramento em lugares específicos e de uma separação das crianças dos outros membros da comunidade em primeiro lugar, das crianças entre si, em seguida” – Renaut, A. ct Chobaux, J. (1993) 2002:43
Neste período, penso ser importante ressaltar as questões referentes aos conteúdos programáticos da família e educação familiar que abordamos na temática IV da unidade curricular. A educação na idade média estava ligada a contextos sociais, económicos e políticos, sendo um período de formação cristã, tendo por base a educação religiosa pois esta estava dependente da igreja que tinha o papel de educar, formar e conformar. Segundo Renaut, A. ct Foucault (2002:43)
“…se encontra na educação cristã, (…) as mesmas técnicas de dominação que as que se criaram na mesma época no espaço asilar e na organização militar.”
A igreja definia a estrutura educacional e faziam crer que Deus desejava e estabelecia essas mesmas regras. Existia uma preocupação com a formação moral da criança e a igreja encarregava-se de direcionar a aprendizagem, tendo como objetivo a correção dos desvios da criança, pois nessa altura considerava-se que a criança era fruto de pecado e deveria ser guiada para o caminho do bem.
Segundo Ariès, (1989), no seculo XVII, entre os moralistas e os educadores, formou-se o sentimento de infância que viria a inspirar toda a educação do seculo XX. Por um lado, a criança é vista como um ser inocente que precisa de cuidados, e pelo outro como um ser fruto do pecado. Estas duas visões da criança têm origem numa nova postura da família em relação á criança, que passa a assumir mais efetivamente a sua função, a família começa a perceber a criança como um investimento futuro, que é necessário preservar e deve ser afastada de maus físicos e morais. A vida familiar ganha um caráter mais privado, e aos poucos a família vai assumindo um papel que antes era da sociedade.
A igreja também procurou impor o seu território na família inserindo na mesma a educação bíblica, o que fez nascer um novo modelo de família cristã, e onde se formaram mosteiros e ordens religiosas para onde os nobres pudessem ser ensinados e formados junto com os de classe dominantes. Em consequência, o caso de analfabetismo junto das classes baixas era praticamente geral, pois os indivíduos de classes baixas não tinham acesso ao ensino.
No século XVIII, além da educação, a família começou a interessar-se por questões relacionadas com a higiene e a saúde da criança, o que se refletiu numa considerável diminuição dos índices de mortalidade infantil. Mas estas mudanças beneficiaram apenas as crianças da burguesia, pois as crianças das classes baixas continuaram a não ter acesso à educação e a cuidados mais específicos, mantendo-as direcionadas para o trabalho.
Por último, Ariès ressalta um terceiro período que consiste na consolidação do conceito de infância, onde destaca, que é neste período que a criança começa a ocupar o lugar central na família.
É importante ressaltar que as mudanças do conceito de infância ao longo dos tempos não surgiram de forma linear e ascendente. A realidade social da infância é resultado da organização da sociedade e inserida em cada um dos períodos históricos, no âmbito das diferentes classes sociais se diferenciou e se diferencia o papel exercido pela criança.
Neste sentido é possível fazer um novo paralelismo com os conceitos abordados na unidade curricular, mais especificamente nas “Mudanças no Estatuto Social e Familiar da Criança”:
“Cada sociedade mantém com a infância, com as crianças, relações particulares que dependem da sua organização social e económica, da relação entre sexos e sistema de representação do laço intergeracional, etc. (…) O lugar da criança e o tipo de educação que lhe está destinado são tributários de numerosos fatores contextuais, económicos, políticos, sociais e culturais. Não existe, evidentemente, um “modelo educativo”, mas uma pluralidade de modelos respondendo a esta diversidade histórica e social.” – Rollet, C. (2013)
A partir do século XIX, com base nas ciências como a Medicina, Psicologia e Pedagogia, foi possível estabelecer uma separação das crianças em relação aos adultos, como sendo uma categoria social vulnerável e com necessidades de proteção. Os limites etários foram definidos ao longo da história. Para Ariès, entre o seculo XVI e XVII, as idades eram em número de sete, indicando o número de planetas, sendo que cada idade tinha a duração de sete anos, descritas como: infância, puerítia, adolescência, juventude, senectude, velhice e seniéus. Mas convém ressaltar que nessa época não havia uma preocupação em teorizar sobre a criança.
Já no seculo XX, contributos como os do psicanalista americano Erik Erikson, que define 8 estádios de desenvolvimento humano, Confiança Basal vs. desconfiança básica (0-1 anos), Autonomia vs. vergonha (1-3 anos), Iniciativa vs. dívida (3-6 anos), Causa vs. inferioridade (6 anos até a adolescência), Identidade vs. confusão de papéis (puberdade), Intimidade vs. Isolamento, Generatividade vs. Estagnação e Integridade do ego vs. Desespero, e defendia que cada pessoa experimenta situações de crises na vida as quais estamos tentados a defini-las como algo negativo. Segundo Erik Erikson, as crises não são apenas inevitáveis, mas são até mesmo um processo natural e necessário, a base de toda mudança e progresso.
O autor caracteriza as adversidades como episódios desafiadores que nos permitem exceder e capacitar mais sobre nós mesmos. Erikson estava convencido de que as pessoas continuam a mudar as suas vidas e a ganhar sempre novas experiências e conhecimentos. No âmbito legislativo, por exemplo, e segundo a Convenção dos Direitos das Crianças, a pessoa até aos 18 anos é considerada criança. Assim sendo, é importante realçar que a história da criança é uma história sobre elas. É necessário ter em conta que as crianças são sujeitos de relações sociais amplas e que estas fazem parte das suas vidas. Através das interações sociais, as crianças adquirem valores e comportamentos próprios relativamente ao tempo e espaço em que estão inseridas. Este é um processo social, cultural, histórico e psicológico.
No século XX, surgiu o reconhecimento da importância das relações entre as crianças e os seus progenitores, nomeadamente através da valorização da amamentação e da maternidade. “A infância é, assim, uma construção social recente, que traz consigo uma norma, isto é, a representação do que deve ser uma infância normal e desejável e um ideal do que se entende por “bem-estar infantil” (Almeida, A e col., 1999). Reflete a mudança de sentido da própria família moderna, a qual se tornou num espaço de afetividade (onde se estabelecem relações sentimentais entre o casal e os filhos) e num lugar de atenção à infância que, não obstante, pode ser “cor de rosa” ou “sombrio” (Aries, P, 1999)” Magalhães, T. (2010: 11)
Outro ponto importante, é a visualização da criança como um cidadão com direitos. Esta alteração interfere na forma como é definido o conceito de infância, na medida em que a criança passa a ter valor. “A criança é apreendida como uma pessoa. É neste sentido que penso que a Convenção está voltada para o seculo XXI. Tira-se da cabeça que a criança é um pequeno ser frágil a proteger contra outrem e contra ela mesma para lhe reconhecer uma cidadania. Muitas pessoas também dizem a propósito da criança: ‘É preciso prepará-la para ser cidadão.’ A Convenção acaba de dizer: ‘Não, ela é cidadão.’” – Renault, A. ct Rozencz-Weing, J. (2002:296)
Em paralelismo, mais uma vez com uma das temáticas abordadas na unidade curricular “Transformação da morfologia familiar na contemporaneidade” é importante referir que a família e o sistema familiar são fundamentais para o desenvolvimento da criança, pois é através destes que a criança vai adquirir valores, crenças e fortalecer vínculos positivos e saudáveis com os membros da família.
Citando Giddens, a família é:
“Um grupo de pessoas unidas diretamente por laços de parentesco, no qual os adultos assumem a responsabilidade de cuidar das crianças” – Giddens, A. (2007:175)
A noção de parentesco ao longo dos tempos foi sofrendo uma evolução, ultrapassando a individualidade e os laços biológicos ou legais. A família é constituída por vários subsistemas, o individual, o conjugal, o parental e o fraternal. Por consequência, a estrutura familiar resulta da organização dos subsistemas e do desenvolvimento das relações dentro de cada subsistema e entre eles.
“A emergência de determinadas formas de (re)composição familiar tem vindo a tornar mais visível outros atores sociais que, além do pai e mãe, ocupam um lugar de destaque em muitos grupos domésticos, como os avós, os tios e os padrastos ou madrastas. Em alguns casos surgem de forma abrupta, sem que haja espaço para a integração de novas relações de autoridade ou a reconstituição dos afetos rompidos” Sampaio, D. (2001:16)
As famílias podem ser identificadas, independentemente da sua estrutura ou dimensão, e podem ser classificadas como famílias nucleares, monoparentais, adotivas, homoparentais, reconstituídas e alargadas. Cada família é única e não existe uma tipologia ou modelo a seguir. Não existem famílias melhores do que outras. Desta forma, o que é importante é que a família, independentemente da sua estrutura, leve a cabo as funções que lhe são inerentes, quer a nível económico, educacional e de segurança, tendo sempre como principal objetivo o bem-estar e o superior interesse da criança.
Em muitos casos, o problema encontra-se no facto dos progenitores e/ou familiares não conseguirem, ou mesmo, não quererem cumprir essas funções, acarretando riscos para os menores.
“(…) as funções desempenhadas pelas crianças para os pais não são propriedades objetivas, mas sim uma construção social, isto é, uma representação coletiva daquilo que se pode eventualmente esperar da criança. Tal representação encontra-se muitas vezes, quer na origem dos abusos infligidos às crianças, quer na sua legitimação.” Magalhães, T. (2010:11)
Neste sentido é importante contextualizar que as crianças e jovens em risco são menores que são mais suscetíveis de desenvolver um comportamento de risco. Estas crianças e jovens em risco que se encontram com dificuldades ou problemas diversos, em diferentes níveis, muitas vezes colocam o seu bem-estar físico e desenvolvimento intelectual em causa, devido aos contextos desfavoráveis em que estão inseridos.
Segunda a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei nº 147/99, de 1 de setembro) considera-se que uma criança está numa situação de perigo quando:
“a) Está abandonada ou vive entregue a si própria; b) Sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais; c) Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal; d) É obrigada a atividades ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento; e) Está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional; f) Assume comportamentos ou se entrega a atividades ou consumos que afetem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento sem que os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação (p. 6117).”
A discussão referente ao abuso de crianças iniciou-se em Portugal em 1911 com a Lei da Infância e da Juventude, mas apenas a partir dos anos 80 se tornou objeto de investigação e intervenção. Em 1991 forma criadas as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens e em 1998, a comissão Interministerial para o estudo da articulação entre Ministérios da Justiça e da Solidariedade e a Segurança Social, definiu crianças em risco como
“aquelas crianças sujeitas a maus tratos, a quem os pais não prestam cuidados necessários ao seu desenvolvimento e aquelas que, com o seu comportamento, ponham elas próprias em causa o seu crescimento.”
É necessário ainda diferenciar os conceitos de crianças e jovens em risco. Assim, uma criança ou jovem em risco é aquela que ainda não intensificou as situações desfavoráveis, mas que é mais propícia de a alcançar que os restantes pares, enquanto que uma criança ou jovem em perigo é aquela que está numa situação limite, que pode ser considerada urgente uma vez que põe em perigo a sua sobrevivência.
É indispensável compreender os fatores de risco de forma a entender os motivos pelos quais as crianças e jovens se encontram em contextos contrários aos indispensáveis para o seu correto desenvolvimento.
Estas situações de risco podem estar associadas a maus tratos infantis, onde se inserem os contextos familiares e fatores adjacentes aos progenitores/tutores, à própria criança ou jovem e aos contextos sociais em que estão inseridas.
“Estes fatores podem funcionar como indicadores inespecíficos e aparecem, frequentemente, associados. A sua associação potencia o risco de se verificarem situações de abuso, ou seja, a confluência destas circunstâncias podem configurar uma situação de perigo real para a criança, ficando esta exposta às diversas formas de abuso.” Magalhães, T. (2010:31)
Assim, é importante definir fatores de proteção para estas crianças e jovens, tendo em conta a sua individualidade, o seu contexto familiar, social e cultural, o que após identificação, existe a possibilidade de recuperação de risco o que irá beneficiar o desenvolvimento social e individual da criança ou jovem.
Neste sentido, os fatores protetores são fatores considerados positivos, pois colmatam o risco a que a criança ou jovem está exposta. A família pode ser considerada um fator protetor, desde que exista uma rede de apoio entre os seus elementos, pois a família é essencial para o desenvolvimento de qualquer criança.
A ligação afetiva e segura é vista como um traço evolutivo e interativo, dependendo principalmente das relações dos pais com as crianças, de questões de maior ou menor incidência de fatores de risco e da existência de fatores protetores. As questões relativas ao conceito de maus tratos infantis, ao longo dos tempos, tem vindo a sofrer uma evolução científica, na medida em que a criança é reconhecida como um ser autónomo e interativo, desde o seu nascimento.
“(…) Kant definia como ‘menor aquele que precisa de tutores’: apesar disso, esta ‘menoridade’ não mantém a criança no não-direito, significa que é titular de direitos desde que nasce, não pode ser obrigada a exercê-los ela mesma imediatamente e designa os que têm o poder e o dever de zelar pelo respeito dos seus direitos fundamentais.” Renaut, A. (2002:302)
Segundo Sampaio (2001), nunca como hoje as famílias, muito em especial os pais, terão estado no centro das atenções da sociedade que os observa no seu desempenho, tendo em conta a privilegiada e importante tarefa que lhes atribui a educação dos filhos. Também nunca como hoje, os técnicos da área social da educação e saúde terão estado tão atentos às necessidades das crianças e ao desempenho educativo dos pais.
O sistema de vinculação entre mãe e filho, assim como a instigação do meio ambiente, são potenciadores do desenvolvimento intelectual e moral da criança, assim como do seu crescimento. Desta forma, existe uma necessidade de proteção da criança, por parte dos progenitores. Esta proteção surge do reconhecimento da criança como um ser indefeso. O problema manifesta-se quando ao invés da criança ser protegida, ela é maltratada dentro do seio familiar.
As crianças por norma, confiam nos adultos, especialmente na sua família, e consideram os episódios de violência como atos isolados e únicos, mas quando surgem diversas repetições destes episódios, estes geram na criança sentimentos de frustração.
Aceitar que o problema de negligencia por parte dos pais ou cuidadores podem advir de condições de vida como a violência, desemprego, precariedade laboral, é considerado uma interpretação quem sem sempre é abordada de forma rigorosa.
Em Portugal, as questões de maus tratos infantis já abrange um elevado número de crianças, que foram descontextualizadas do seu seio familiar e foram institucionalizadas. Estudos revelam que crianças e jovens vítimas de maus tratos revelam atrasos no crescimento, atrasos de desenvolvimento, problemas cognitivos, atrasos na linguagem, dificuldade de relacionamento com os pares e com os adultos, insucesso escolar, perturbações de personalidade, comportamentos sociais de risco, baixa autoestima, sem expectativas de futuro e são propícios a atos de delinquência e criminalidade. Magalhães, T. (2010)
É possível observar que cada vez mais existe uma preocupação e uma sensibilização da sociedade para estas questões, assim como uma maior diversidade de informação sobre os maus tratos a menores. Existe uma necessidade de pertinência dos programas interventivos e de proteção, não só por questões políticas, mas também por questões de ordem publica, sendo oportuno implementá-los nas comunidades locais e nas instituições socioeducativas.
Dá-se uma relevância maior ao sistema familiar e do funcionamento das suas dinâmicas no que diz respeito a atuar sobre as questões de maus tratos, onde são trabalhadas duas áreas fundamentais, o apoio familiar e a educação parental, onde estão inclusos programas de formação parental e apoio psicológico.
“(…) a educação parental passa a fazer sentido para todas as famílias, democratizando-se de certa forma ao ser assumida como promotora de espaços privilegiados de incremento do desenvolvimento humano, com um caracter preventivo, em que os indivíduos podem adotar um papel de proatividade.” Sampaio, D. (2001:27)
É também de extrema importância, o papel da escola e dos educadores para a prevenção e sinalização dos maus tratos em crianças e jovens, uma vez que é possível observar os alunos diariamente no que diz respeito aos seus comportamentos e à sua condição física. Além disso, criam-se laços entre os alunos e os professores que facilitam a deteção de casos de maus tratos, pois os alunos, caso tenham uma relação de confiança com os professores, tendem a desabafar com eles.
Para existir uma intervenção, tem que existir prevenção, e para tal é essencial existirem equipas multidisciplinares, de forma a serem detetados os casos de risco, e para ser possível intervir, de forma a obter os melhores resultados para a criança ou jovem.
Estudos consideram que a melhor forma de intervenção consiste no envolvimento da criança, da família no programa em que está integrada, onde são avaliados posteriormente a evolução, ou modificações do comportamento familiar através das visitas domiciliarias.
É normal existir um menosprezo pelas capacidades que as famílias têm, uma vez que sempre existiu uma culpabilização da família por parte da sociedade, focando-se apenas nos problemas destas e nunca na sua eficiência. Ao mesmo tempo, se refletirmos sobre as propostas denominadas de “Acordos de Promoção e Proteção” é possível subentender que estes estão assentes em questões burocráticas que se traduzem na imposição do acompanhamento dos pais no seu percurso educativo, incutindo-lhes a assiduidade e a pontualidade, e caso exista incumprimento destes valores, os pais poderão ser penalizados e ficar sem apoios sociais ou medidas de proteção.
Esta penalização não acontece apenas nos “Acordos de Promoção e Proteção” em crianças e jovens sinalizados, mas também está implícito no Estatuto do Aluno e Ética Escolar. Neste sentido, estas medidas ao invés de se tornarem um estímulo para os pais trabalharem com os professores, consistem em medidas estandardizadas e impositivas sem qualquer consideração pelas especificidades de cada família e os contextos em que estão inseridos.
“ A Lei da Proteção, erguida sobre um alicerce de conhecimento pluridisciplinar, reflete, organiza e disciplina juridicamente esta responsabilidade repartida na promoção dos direitos e na proteção das crianças e jovens cujo superior interesse foi agredido, em que as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens ocupam um lugar central, na convicção de que ‘é hoje inquestionável que uma intervenção de base comunitária desformalizante e sobretudo desjudicializada revela reais vantagens na negociação das soluções, por oposição a uma intervenção coativa e estigmatizante como é a dos tribunais’ (Ministério da Justiça/Ministério do Trabalho e da Solidariedade, 1999)” Magalhães, T. (2010: 192)
Em ponto de reflexão, por forma a que um plano interventivo tenha sucesso, é fundamental que haja participação e aprendizagem espontânea e não coerciva de todos os intervenientes, de maneira a que exista uma alteração às vivencias anteriores, tendo como resultado uma transformação social.
Conclusão
Após uma leitura atenta de todos os contributos e pesquisas efetuados por autores e investigadores, pude concluir que o conceito de infância foi um conceito que levou o seu tempo a ser considerado como o é atualmente, ou seja, a criança como pessoa e cidadã. Foi necessário considerar vários fatores, principalmente no que concerne às etapas de desenvolvimento e quais as melhores formas de as vivenciar. Mas algo que sempre foi possível evidenciar, é que a criança, de uma forma ou de outra, sempre ocupou um lugar na família e na sociedade.
Após a consciencialização deste conceito também denotei uma preocupação em definir os seus direitos, e quais as suas necessidades de proteção, no que dizia respeito ao seu bom desenvolvimento, crescimento e segurança.
Um dos principais fatores que é considerado na avaliação dos riscos e perigos para as crianças e adolescentes, é a sua relação familiar, e a vinculação com os seus progenitores. É consumado que existindo problemas familiares, a criança ou adolescente é mais propicia a desenvolver problemas comportamentais na escola e fora dela, fraco aproveitamento escolar e muitas vezes abandono escolar.
Como futura técnica de educação, e com especial interesse na área de intervenção social com crianças e jovens, considero muito importante que exista uma forte intervenção nas famílias e nas crianças e adolescentes em simultâneo. Penso que seria essencial existirem CAFAP (Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental) em todas as freguesias do território nacional, para ser possível dar resposta aos inúmeros pedidos e necessidades que existem diariamente. O ‘problema’ deve ser esmiuçado na sua origem (seio familiar) e não nas suas consequências.
Uma intervenção precoce, quer nas escolas, quer em espaços de convívio é muito importante para prevenir situações de perigo ou risco para as crianças e jovens, que considero mais eficaz do que apenas uma intervenção posterior à sinalização. Se todas as crianças e jovens possuíssem intervenções precoces na escola, através de avaliações psicológicas, por exemplo, diminuiria o número de casos problemáticos, o que faria com que fosse possível uma melhor intervenção, mais qualificada, em casos que pudessem surgir de maior problematização. Este é, na minha opinião, uma falha que ainda existe, a falta de uma intervenção precoce, para prevenir intervenções já consideradas problemáticas.
Discente: Diana Borges
Docente: Maria Cristina Rocha - FPCEUP
Unidade Curricular: Sociologia da Família e Educação Familiar

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